Eu só quero ser feliz e hoje eu sou feliz”, são as palavras de Neuraci Barbosa de Oliveira, logo no início da nossa entrevista. Vítima de violência, ela buscou ajuda para se livrar do terror vivido dentro da própria casa. A aposentada começou a trabalhar ainda criança, passou fome, criou filho sozinha, foi agredida pelo ex-marido e enfrentou um câncer. Aos 70 anos comemora ter conseguido seguir em frente. Superou traumas e manteve um sorriso contagiante no rosto.
Em 2022, após seis anos com um marido agressor, conseguiu dar um basta na violência sofrida. Procurou uma delegacia, foi ouvida, acolhida e o ex-companheiro acabou preso. “Ele não me deixava dançar, nem conversar com ninguém. Era estúpido, falava palavrão, chegou a me empurrar no portão, me chutar. Aconteceu muita coisa”, conta.
O apoio do Ceamca (Centro Especializado de Atendimento à Mulher, à Criança e ao Adolescente em situação de violência) foi essencial para a superação, incluindo acompanhamento psicológico. Neste período ela ainda passou por um tratamento contra o câncer de mama. “Eu acho que se eu não tivesse encontrado esse apoio não sei se aguentaria”, diz em tom de alívio. A terapia é considerada pela aposentada uma “virada de chave”.
Atualmente dona Neuraci comemora ter conseguido deixar para trás tudo de ruim: “Aos fins de semana vou dançar, faço academia, acabei de reformar minha casa. Saio a hora que quero, chego a hora quero. Nunca mais tive tristeza, angustia ou solidão”.
Feliz por ter conseguido encaixar a reforma da casa no orçamento, a aposentada curte a família bem de perto, já que o neto de 9 anos, o filho de 38 e a nora moram no mesmo terreno que ela.
Nascida em Dourados, vinda de uma família com 11 filhos, dona Neuraci trabalhou 24 anos em lavoura, foi vendedora, atendente, mãe solteira e chegou a passar fome com o filho. “Nunca fui de pedir nada a ninguém. Passei muita necessidade”, lembra.
Aos 61 anos, mais um momento de superação e de muito orgulho. O diploma do curso de filosofia. Inspirado pela mãe, o filho de dona Neuraci também cursou a mesma faculdade e formou-se um ano depois da mãe.
Dona Neuraci aconselha outras mulheres vítimas de violência doméstica a “darem um basta”. As palavras de encorajamento são a forma encontrada para tentar ajudar quem ainda precisa ser apoiada. “Não precisamos de homem para nada. Conseguimos tudo que a gente coloca na nossa cabeça. Precisamos ter coragem, determinação. Dar valor a nós mesmas”, diz.
Depois de tudo que passou e o que conquistou, a aposentada ainda tem um desejo: “Cheguei a tocar sanfona, mas tive que vendê-la. Meu sonho é aparecer na televisão, toda bonita. Virar uma artista”. Palavras de quem, apesar de tantos momentos difíceis, buscou ajuda e encontrou amparo em uma rede de apoio pronta para acolher.
Em Mato Grosso do Sul, as ferramentas para atendimento à mulher vítima de violência vão desde canais para denúncia on-line e solicitação de medida protetiva ao atendimento pelo WhatsApp no Ceamca (Centro Especializado de Atendimento à Mulher, à Criança e ao Adolescente em situação de violência).
O QUE É IMPORTANTE SABER EM CASO DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER:
Em caso de urgência e emergência: ligue 190. Para fazer uma denúncia ou pedir informações: ligue 180. Para solicitar uma visita da Patrulha Maria da Penha: ligue 153.
Existe uma Rede de Atendimento estruturada na Casa da Mulher Brasileira em Campo Grande, sendo esta a primeira do país, além de serviços descentralizados nos municípios presentes em 12 delegacias de Atendimento à Mulher e 36 Salas Lilás (Ribas do Rio Pardo, Rio Negro, Água Clara, Amambai, Caarapó, Bonito, Terenos, Maracaju, Nova Alvorada do Sul, Deodápolis, Glória de Dourados, Costa Rica, Angélica, Ladário, Camapuã, Eldorado, Iguatemi, Bandeirantes, Sonora, Chapadão do Sul, Miranda, Porto Murtinho, Anaurilândia, Anastácio, Paranhos, Selviria, Sidrolândia, Brasilândia, São Gabriel do Oeste, Ivinhema, Itaporã, Jatei, Batayporã, Guia Lopes da Laguna, Dois Irmãos do Buriti e Douradina). São todas salas implantadas nas delegacias de polícia destes municípios com o objetivo de humanizar o atendimento à mulheres vítimas de violência. Em Jardim existe a Casa da Mulher Jardinense.
CASA DA MULHER BRASILEIRA
Para denunciar e passar pelo primeiro atendimento, procure a Casa da Mulher Brasileira ou uma Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher. Lembrando que o atendimento na Capital é 24h. Endereço: Rua Brasília, lote A, quadra 2 – Jardim Imá. Telefone: 2020-1300.
CEAMCA (CENTRO ESPECIALIZADO DE ATENDIMENTO À MULHER, À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA)
Atende mulheres vítimas da violência doméstica ou qualquer outra agressão por causa do gênero. Primeiro a vítima passa por uma triagem para depois ser atendida por psicólogas e assistentes sociais. Desde o início do mês passou a atender também os filhos crianças e adolescentes das mulheres assistidas.
Endereço: Rua Piratininga, 559 – Jardim dos Estados. Telefone: 0800-067-1236
DENÚNCIAS ON-LINE
Para denunciar violência doméstica pela internet, basta acessar o site da Delegacia Virtual da Polícia Civil, clicar em “Registrar Denúncia”, e posteriormente em “Violência contra a Mulher”. O registro no site pode ser feito a partir de qualquer região de Mato Grosso do Sul.
MEDIDA PROTETIVA ON-LINE
Para pedir a medida protetiva on-line é preciso acessar o site do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, clicar na aba “protetivas on-line”, fazer o cadastro. Em seguida, descreva toda situação e anexe fotos ou documentos. A medida é encaminhada para o juiz e analisada em até 48 horas (durante o expediente forense). Lembrando que este tipo de pedido de medida protetiva on-line só está em funcionamento em Campo Grande atualmente.
MINISTÉRIO PÚBLICO
Atendimento pelo WhatsApp: (67) 99825-0096. O telefone da 72ª Promotoria de Justiça da Casa da Mulher Brasileira é o (67) 3318-3970.
DEFENSORIA PÚBLICA
Atendimento por WhatsApp: (67) 99247-3968. Atendimento on-line: defensoria.ms.def.br. Núcleo de Defesa da Mulher: (67) 3313-4919.
PROGRAMA MULHER SEGURA DA POLÍCIA MILITAR
O Promuse foi institucionalizado em 2018 e tem como objetivo auxiliar as mulheres vítimas de violência doméstica, com foco em prestar todo o suporte necessário para o rompimento desse ciclo da violência. A equipe de policiais militares do Promuse fiscaliza as medidas protetivas de urgência, realiza palestras visando a prevenção primária, além de auxiliar o Judiciário e o Ministério Público através de relatórios de riscos individuais.
CASA ABRIGO
A Casa Abrigo para mulheres em risco de morte iminente em razão da violência doméstica foi inaugurada em 2001. É um equipamento protegido, sigiloso e temporário, no qual as usuárias permanecem por um período determinado, submetendo-se às regras estabelecidas para manter o anonimato e a segurança de todas.