O Vasco anunciou a entrada com pedido de recuperação judicial para gerir as dívidas da associação e da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do clube. O requerimento foi enviado à 4ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) na segunda-feira (24).
“A recuperação judicial é fundamental neste momento, uma vez que reforce o comprometimento com o presente e o futuro do Vasco da Gama”, afirmou o clube em comunicado divulgado em suas redes sociais.
Relatório recente feito pela consultoria Alvares & Marsal, contratada pelo Vasco, apontou que as dívidas do clube chegam a R$ 1,4 bilhão.
Investidor
O imbróglio vascaíno, porém, vai muito além de um plano para o pagamento de suas dívidas estratosféricas. A 777 Partners, investidora da SAF do Vasco, entrou com um recurso pedindo o adiamento da decisão judicial sobre o tema.
A empresa norte-americana alega ser dona de 70% da SAF do clube de São Januário, com investimento R$ 300 milhões. Por isso, alega que caso obtenha a recuperação judicial, o Vasco estaria sujeito à falência, o que faria com que o dinheiro investido pela 777 corresse o risco de ser perdido.
A 777 também afirma que, apesar de ter sido afastada da gestão da SAF do Vasco em decisão da Justiça do Rio no ano passado, teria o direito de vetar a estratégia do clube para gerir suas dívidas.
“Por essa razão é que a decisão liminar proferida em maio de 2024 não pode ser utilizada como se fosse um ‘cheque em branco’ para o CRVG [Clube de Regatas Vasco da Gama] fazer o que bem entender em relação à gestão e destino da SAF, tampouco para formular pedido de recuperação judicial, que, como todos sabem, é uma medida extremamente grave e com efeitos irreversíveis”, afirma a petição apresentada em nome da empresa pelo escritório Dickstein Advogados, cuja cópia foi obtida pela Máquina do Esporte.
Recuperação judicial
Mas o que seria a tão polêmica recuperação judicial pedida pelo clube?
Uma recuperação judicial é um mecanismo previsto pela lei 11.101/2005, que tem como finalidade ajudar empresas em dificuldade financeira a se reestruturar e evitar a falência.
“O objetivo é possibilitar que a empresa continue operando, preservando empregos e garantindo o pagamento dos credores dentro de um plano aprovado pela assembleia geral de credores e homologado pela justiça”, explica Rodrigo Vaz Mendes Sampaio, do escritório MPNR Advogados.
“Todo o procedimento se dá com o acompanhamento de um administrador judicial nomeado pelo juiz”, acrescenta Sampaio, que é especialista em direito empresarial.
Aprovado o plano pela assembleia de credores, a empresa é obrigada a seguir a determinação da Justiça. O administrador judicial, por sua vez, é responsável por fiscalizar se o plano está sendo cumprido pela empresa.
Credores
Os credores podem ser outras empresas, fornecedores, governo, bancos, funcionários e ex-funcionários que tenham alguma quantia a receber. Esses valores são renegociados, em geral com algum desconto que torne viável o pagamento.
“A lei prevê uma ordem de preferência desses credores. Dívidas trabalhistas e fiscais têm preferência de pagamento”, ressalta Sandro Schulze, sócio do escritório A. C. Burlamaqui Consultores.
As dívidas trabalhistas de até 150 salários-mínimos (equivalente hoje a R$ 227.700) têm prioridade de pagamento. No entanto, o advogado ressalta que valores acima disso vão para o fim da fila.
“O devedor apresenta um plano de pagamento, que é submetido aos credores, que podem aceitar ou não. Em geral há um deságio da dívida, que é uma forma de tornar a empresa capaz de pagá-la”, conta Schulze, que é mestre em Direito Civil pela PUC-Rio e especialista em Direito Civil Constitucional pela Uerj.
Benefício x risco
Há ainda outros benefícios assegurados ao devedor após entrar com pedido de recuperação judicial.
“Esse mecanismo oferece diversas vantagens, como a suspensão de execuções e cobranças por um período determinado [180 dias], a negociação coletiva com credores e a possibilidade de alongar prazos e reduzir valores das dívidas”, destaca Sampaio, da MPNR Advogados.
Outra benesse é a possibilidade de haver um prazo maior para a quitação dos débitos. Mas há um risco que não pode ser ignorado.
“Se a empresa não cumprir o plano de recuperação judicial, pode ir à falência. Nesse caso, o credor pode ficar sem receber nada”, alerta Schulze.
Esse mecanismo legal, assim, auxilia a empresa a manter as operações e a preservar seu patrimônio. No entanto, nos últimos anos, o instrumento jurídico não tem ficado restrito ao mundo corporativo.
“Apesar de aplicar somente às sociedades empresárias, o Poder Judiciário vem admitindo que clubes de futebol, que são associações, entrem com pedidos de recuperação judicial, como foram os casos de Sport Recife, Santa Cruz, Cruzeiro e Guarani”, lembra Sampaio.
“No caso do Vasco, o pedido envolve tanto a SAF, que é uma sociedade empresarial, como o clube, que é uma associação”, acrescenta.
Nota oficial
Veja abaixo a nota oficial do Vasco na íntegra:
“O Clube de Regatas Vasco da Gama (CRVG), reiterando seu compromisso com a transparência e o respeito a toda comunidade vascaína, informa que deu entrada no pedido de recuperação judicial do VascoSAF e do CRVG na 4ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), nesta segunda-feira, 24 de fevereiro.
Após concluir com sucesso a etapa das mediações, é hora de a instituição avançar para a próxima fase. A recuperação judicial é fundamental neste momento, uma vez que reforce o comprometimento com o presente e o futuro do Vasco da Gama.
A restrição, iniciada em junho de 2024, tem como objetivo restabelecer, efetivamente, a saúde financeira do Club e da SAF. Esse processo segue contando com o suporte da Alvarez & Marsal e de renomados escritórios de advocacia altamente especializados.
A recuperação judicial é fundamental para aumentar a segurança jurídica, criando um cenário de previsibilidade e estabilidade financeira, favorável para atrair novos investidores e eventualmente, uma futura negociação pautada pela responsabilidade.
O CRVG e o VascoSAF reafirmam que as operações do dia a dia e os investimentos no futebol continuam, assim como o pagamento em dia dos trabalhadores, atletas e demais obrigações.
Decisões difíceis, mesmo quando amargas e impopulares, não diminuem a verdade e determinação da atual administração de enfrentar esse desafio de maneira firme e responsável. Ou se é apesar da realidade, ou corre o risco de seguir repetindo os mesmos erros do passado.
As informações sobre o processo de recuperação financeira serão atualizadas através dos canais oficiais de comunicação.
Saudações Vascaínas
Pedrinho
Presidente do Clube de Regatas Vasco da Gama
Carlos Amodeo
CEO da Vasco SAF”