Meu pai morreu no último dia 25 de abril e, no meio de uma dor que eu nem sabia que existia, fui impactada por uma onda de mensagens incríveis rememorando passagens icônicas dele. Pode parecer papo de filha coruja (e, claro, tem um pouco disso), mas ler tantas histórias dele me fez pensar em conceitos tão atuais quanto “influenciador” e “multiplataforma”.
Sou filha do jornalista Carlos Leonam, que clicou sentado no banco de reservas do Brasil a seleção de basquete medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Roma 1960 e dirigiu inúmeros filmes do Canal 100 em Copas do Mundo de futebol. Deu expediente no Pasquim, O Cruzeiro, O Globo, Jornal do Brasil, Tribuna da Imprensa, Última Hora… Mais tarde, já no mundo corporativo, se envolveu com diversas campanhas de marketing e patrocínio esportivo. Dele, herdei três paixões: escrever, esporte e o nosso Fluminense.
Papai praticamente não me deixou escolha que não fosse ser jornalista. Quando comecei minha carreira em redação e passei a frequentar a tribuna de imprensa das Laranjeiras, ele contava sorrindo que tinha virado “o pai da Manoela”. E eu enchia o peito afirmando positivamente quando me perguntavam se era eu “a filha do Leonam”.
Depois, inventei de querer ser repórter fotográfica de futebol, nos meus 14-15 anos, e lá foi ele dar um jeito de me credenciar na Arfoc e me colocar dentro do carro de reportagem do esporte de O Globo, com Antônio Maria Filho de “babá”. Ele me levou aos Jogos Olímpicos de Atlanta 1996 e à Copa do Mundo dos EUA em 1994 – e enchia meu imaginário com suas histórias fantásticas em coberturas esportivas mundo afora.
Quando nem existia esse papo de “multiplataforma”, lá estava ele, ora escrevendo, ora fotografando, ora dirigindo vídeos. Isso porque nem se sonhava com rede social naquele tempo… É algo que eu costumo dizer (e que talvez tenha sido ele quem me mostrou na prática): uma vez sabendo com quem se quer falar, tendo clara a mensagem e conhecendo os canais disponíveis, a comunicação não tem mistério.
Numa era analógica, papai foi capaz de influenciar hábitos de uma geração. E aí não sou eu quem estou dizendo.
O influencer Leonam foi o responsável por “inventar” os famosos aplausos ao pôr do sol na praia de Ipanema, como lembra ninguém menos que o imortal Zuenir Ventura. Outro craque das letras, Joaquim Ferreira dos Santos, acrescenta: Leonam foi o responsável por trocar o nome da rua Montenegro por Vinícius de Moraes. O premiado Edney Silvestre arremata: Leonam criou o “mito de Ipanema”, quando o hoje cool bairro carioca era quase selvagem. O jornalista João Luiz de Albuquerque não deixa esquecer: “Foi Leonam quem apresentou o Ray Charles para a sociedade carioca”.
Isso tudo sem seguidores comprados, posts pagos ou estratégias de engajamento mirabolantes. Usando o bom e velho “boca a boca” – que, na verdade, nada mais é do que o princípio das redes sociais num mundo pré-digital.
Talvez eternidade seja um pouco isso. Essa atemporalidade. Obrigada, pai, por tantos ensinamentos desde sempre e pra sempre.
Manoela Penna é consultora de comunicação e marketing e escreve mensalmente na Máquina do Esporte.