Voluntários franceses fabricam materiais militares para o país em guerra e aceitam risco da prática ilegal, que pode ser de cinco anos prisão e multa de R$ 436 mil Periscópios, projéteis de granadas, peças para drones: desde a invasão russa, em 2022, um grupo de voluntários franceses fabrica material militar impresso em 3D para enviar aos soldados ucranianos à margem dos canais oficiais de ajuda:
— Nossos governos não estão realmente fazendo o trabalho, e eu tenho a possibilidade de fazer uma pequena parte, então eu faço — diz um voluntário .
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Quando Vincent (nome fictício) chega até as paredes brancas de uma empresa parisiense, na qual costuma negociar, a transação é rápida. Pesa a caixa de 6kg, paga e ninguém pergunta sobre o conteúdo.
— Quando chego eu falo que é plástico — disse à AFP.
Na verdade, o pacote tinha 180 aletas de plástico, similares às dos foguetes. Em garrafas carregadas de explosivos, elas podem ser lançadas na frente russa a até 2 mil km de distância. A fabricação e a venda de armas é ilegal no país, punível com cinco anos de prisão e uma multa de 75 mil euros (R$ 436 mil), mesmo para peças de armas, esclarece o escritório de advocacia Doumic.
Exceto pelo preço da impressora, o processo de produção é barato. A 10 euros (R$ 58 reais) o quilo do plástico, o último envio de Vincent custou a ele 70 euros (R$ 406 reais), incluindo as despesas com transporte. Nos últimos dois anos, a Exército Druk entregou quase 151 toneladas de equipamento, com impressoras “aos principais países ocidentais”, segundo Chernobaev.
Inicialmente voltado para ucranianos, seu site agora tem uma página para estrangeiros e hubs em 11 países europeus para centralizar os envios.
Fabricação caseira
Nos fundos de um quarto, a impressora 3D de Vincent prepara a seguinte encomenda: partes de um periscópio, que é um instrumento óptico que permitirá que os soldados que estiverem escondidos vejam os inimigos sem serem vistos.
Granadas, suportes para drones, projéteis: na tela do computador do voluntário aparece uma página semelhante a uma lista de pedidos. São arquivos capazes de transformar simples bobinas em filamento de plástico. Por trás dessa interface está a organização ucraniana Exército Druk. Esse “exército de impressoras”, criado em 2022, transmite os pedidos dos soldados a cerca de seis mil e quinhentos voluntários equipados com impressoras 3D.
— Nosso país não estava preparado — explicou à AFP um dos fundadores, contatado por telefone na Ucrânia, orgulhoso de poder fornecer armas desse material à linha de frente.
Impressora 3D imprime peças de periscópios que Vincent está imprimindo em sua casa.
Foto: Geoffroy VAN DER HASSELT / AFP
Tentando ajudar
Pesquisador do Centro de Estudos em Segurança do Instituto Francês de Relações Internacionais, Léo Péria-Peigné explica que a bricolagem (criar ou modificar objetos utilizando materiais disponíveis) sempre foi uma solução em situações de guerra.
— No âmbito do conflito ucraniano, o material criado antes da guerra talvez seja menos eficaz que o material elaborado, levando em conta as necessidades e as opiniões diretas vindas do terreno.
Xavier Tytelman, redator-chefe da revista Air et Cosmos, e também youtuber, ajuda os voluntários franceses e os soldados ucranianos. Por não dispor de uma impressora 3D, recorreu aos seus seguidores e afirma ter enviado centenas de conectores de periscópio graças a essas pessoas.
— Eu queria me sentir envolvido, tentei ajudar como podia — declarou Guillaume, de 38 anos, que calcula ter produzido em Marselha entre 200 e 300 peças.
No fórum online da organização Wild Bees, criada na Letônia e replicada em outros 22 países, aparecem alguns fabricantes franceses, apesar da ausência de uma filial na França. Janis Ozols, fundador letão, confirma que há participantes franceses, embora nenhum deles pareça estar associado às 200 impressoras ativas atualmente.
— A mão de obra muda rapidamente — explica Ozols à AFP.
Atividade ilegal
A alfândega francesa não respondeu quando questionada pela AFP sobre possíveis apreensões dessa produção artesanal.
— Às vezes, não sei exatamente o que estou imprimindo — admite Vincent.
Mas, com exceção dos equipamentos paramédicos e das armas fictícias, a resposta é óbvia:
— Aqui, por exemplo, só é preciso adicionar o explosivo — explica ele, que reconhece ter dúvidas: — Certamente há riscos, mas ainda assim vale a pena.
Mas para alguns, o material letal é benéfico.
— Com um periscópio, você pode evitar que alguém se exponha demais em sua trincheira, ele pode ficar protegido, é diferente — comenta Guillaume.
Para Xavier Tytelman, a palavra de ordem é a mesma: “salvar vidas”. Como eles, Vincent tem laços pessoais com a Ucrânia, onde estava antes da invasão. Ele também ajuda os civis.
— Oito ou dez ucranianos estavam lá — diz ele, apontando para a cama no quarto de seu amigo.
À sua frente, na tela do computador, aparece o contador do site do Exército Druk: desde outubro de 2023, ele produziu mais de 50 kg de material.
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