Páginas de Liberdade: Parceria entre Agepen e universidades permitem que detentos troquem tempo ocioso por conhecimento

A leitura como ferramenta de reinserção social permite que custodiados do sistema prisional troquem horas de encarceramento por conhecimento. Essa é a proposta de oficinas de leitura implantadas em pela Agepen(Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário) em unidades prisionais de Mato Grosso do Sul, que possibilitam diminuição na pena aos detentos. A iniciativa visa, acima de tudo, transformar vidas por meio do acesso à educação e à cultura.

No estado, o projeto da “Remição pela Leitura” é utilizado em presídios desde 2014. Em parceria com o Judiciário, começou pela Vara Criminal de Paranaíba e foi estendida para Aquidauana, Nova Andradina e Campo Grande. Em abril de 2019, uma Portaria conjunta do Tribunal de Justiça normatizou a expansão do programa para os juízos criminais de todas as comarcas sul-mato-grossenses.

Em maio de 2021, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) emitiu um regramento nacional para calcular quantos dias um preso pode reduzir da sua pena por meio da leitura: a Resolução Nº 391. Pela normativa, com participação voluntária, o reeducando poderá escolher uma obra para a leitura a cada 30 dias e fazer uma resenha ou relatório para ser avaliado, possibilitando a remição de quatro dias. Ao final de um ano, terá a possibilidade conquistar até 48 dias a menos no tempo de prisão.

Atualmente, 66% dos estabelecimentos penais em MS têm projetos ativos de Remição pela Leitura. Somente em 2023, mais de 7,4 mil internos participaram. Os dados demonstram uma estatística crescente nos últimos anos, com 4,1 mil participações em 2021 e 6,6 mil em 2022. Para se ter uma ideia, em 2017 eram 276 participantes.

Para o fim deste ano, a projeção da DAE (Divisão de Assistência Educacional) da Agepen é que 8 mil internos sejam atendidos, já tendo registrado 4,5 mil somente no primeiro semestre.

Contribuições que transformam

Coordenada pela Diretoria de Assistência Penitenciária, por meio da DAE, a execução conta com a colaboração de universidades e outras instituições parceiras, que auxiliam na correção dos relatórios escritos pelos internos sobre os livros lidos. Essas parcerias acabam também aproximando o meio acadêmico da realidade prisional, levando novos saberes e compartilhando experiências.

Atualmente, integram o Termo de Cooperação Mútua a UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), UEMS (Universidade Estadual), Unigran (Universidade da Grande Dourados), IFMS (Instituto Federal), Faculdade Insted e a FIPAR (Faculdades Integradas de Paranaíba), além da Igreja Evangélica Missões Brasa Viva, professores voluntários e equipes de servidores das próprias unidades prisionais.

Cada resenha é avaliada com rigor pelas equipes parceiras, garantindo que o processo seja não apenas uma formalidade, mas uma oportunidade genuína de aprendizado. Os critérios incluem clareza, estética textual e a originalidade do conteúdo.

Dentro desse processo, oficinas de leitura são realizadas com a participação dos acadêmicos, sob orientação do coordenador do curso. A Unigran Capital, por exemplo, faz parte deste convênio e atende a três presídios, realizando encontros mensais. “Emprestamos livros do nosso acervo, explicamos como fazer uma leitura direcionada, produção de texto, e um mês depois aplicamos uma espécie de formulário”, comenta Marianny Alves, coordenadora do Projeto de Leitura da universidade. “Temos desde clássicos, como Machado de Assis, a obras mais atuais vencedoras de prêmios literários”, complementa.

Benefícios além da remição

Mais do que uma mera distração, a leitura se revela um instrumento de liberdade mental. Além disso, o projeto inspira interesse por estudos e capacitação profissional.

Para o interno Willian, que se tornou um leitor voraz, a oportunidade vai além da diminuição nos dias de reclusão, é uma chance de crescer. “Eu vejo como um meio de mudar meus passos lá fora, com o livro a gente aprende vários temas, autossuperação, lutar contra vícios, é como se tivesse ganhando ferramentas para sair daqui com o aprendizado e não cometer os mesmos erros”, afirma.

A Lei de Execução Penal assegura que todos os detentos tenham direito à educação, e a Agepen, por meio de sua Portaria nº 15, estabelece diretrizes para a remição pela leitura e a ampliação do acervo bibliográfico, inclusive com o recebimento de doações de obras literárias.

A intenção é que a iniciativa seja promovida como um meio de ressignificação na vida dos apenados, oferecendo novas perspectivas, para que a leitura, de fato, liberte, não apenas do cárcere físico, mas também das limitações impostas pela falta de conhecimento e oportunidade.

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