O emaranhado da corrupção em suposto esquema de venda de sentenças no TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) envolve filhos, esposas e sócios de desembargadores que acabaram afastados por decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Relatório de 110 páginas produzido pela investigação da PF (Polícia Federal) mostra como os magistrados atuavam diretamente com pessoas ligadas a eles. São investigados e foram afastados do cargo os seguintes desembargadores: o presidente do TJ, Sérgio Fernandes Martins, os desembargadores Vladmir Abreu, Sideni Pimentel (eleito para comandar o TJ a partir de 2025), Alexandre Aguiar Bastos e Marcos José de Brito Rodrigues. Além deles, o conselheiro do TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado de MS), Osmar Jerônymo, também foi afastado do cargo.
Para se ter ideia das teias que ligam os magistrados no esquema, a PF pediu a quebra do sigilo telemático, bancário e fiscal dos seguintes desembargadores e filhos:
- Vladimir Abreu da Silva e os filhos Ana Carolina Machado Abreu da Silva e Marcus Vinícius Machado Abreu da Silva;
- Alexandre Bastos e sua filha Camila Bastos;
- Desembargador aposentado Divoncir Schreiner Maran e seus filhos Divoncir Schreiner Maran Júnior, Vanio César Bonadiman Maran, Rafael Fernando Ghelen Maran e Maria Fernanda Ghelen Maran;
- Sideni Soncini Pimentel e seus filhos Rodrigo Pimentel e Renata Pimentel
Conforme as investigações, os dois filhos de Vladimir, Marcus Vinícius e Ana Carolina, possuem (ou possuiam) escritório de advocacia no mesmo endereço de Rodrigo Pimentel, filho de Sideni, o que indica vínculo entre eles.
Em uma situação relatada pela PF, aparece o nome de outro advogado investigado, Felix Jayme, que teria atuado junto a Marcus Abreu para receber pagamento milionário de ação contra o Banco do Brasil.
Isso porque, entre os três desembargadores que deram decisão favorável aos clientes dos filhos do desembargador Vladimir estão Divoncir e Marcos Brito.
E, justamente entre os dois desembargadores há outro elo: os respectivos filhos Diogo Rodrigues e Divoncir Júnior são sócios em escritório de advocacia e investigação apontou que eles, possivelmente, seriam operadores na ‘venda’ de decisões.
Outra personagem de relevância nas investigações é Camila Bastos, filha de Alexandre Bastos e atual vice-presidente da OAB-MS. A investigação aponta que o escritório dela, que já teve o pai como sócio antes dele assumir vaga de desembargador destinada a advogados pela OAB através do Quinto Constitucional, foi beneficiado de decisões favoráveis proferidas pelo pai.
Citado diversas vezes no relatório, o filho de Sideni, Rodrigo Pimentel teria grande proximidade com o desembargador recém-aposentado Júlio Cardoso. Isso porque, em mensagens interceptadas entre os dois mostra conversa sobre decisões judiciais. Há indícios de venda de decisão judicial por parte de Júlio ao advogado filho do colega de TJMS, que teria recebido R$ 275 mil em valores originados de decisão judicial. “São fortes elementos no sentido de que Rodrigo Pimentel seja intermediador na venda de decisões judiciais de Júlio Cardoso”, aponta o documento.
Outro trecho do relatório demonstra como os filhos dos desembargadores desempenhavam papel-chave no esquema: “A negociação de decisões judiciais ocorria por intermédio dos filhos dos desembargadores, os quais são, em sua maioria, advogados e sócios de escritórios de advocacia e utilizariam de suas pessoas jurídicas na intenção de burlar os mecanismos de rastreamento do fluxo de dinheiro”.
Esposas e sócios entram na teia da corrupção
Além da atuação de filhos advogados, os desembargadores investigados se utilizavam das esposas para operar o esquema.
Um exemplo citado pela investigação é o fato de Sideni ter declarado que em 2015 alienou dois imóveis e, com isso, adquiriu cotas de capital social da empresa RGP & Shorp Holding e Participações Ltda em nome da esposa, Maria Aparecida Gonçalves Pimentel, no valor de R$ 657.449,00, cujo proprietário era o filho deles, Rodrigo Pimentel e a nora do desembargador Silvia Pimentel.
No entanto, os imóveis não haviam sido declarados no ano anterior e, de repente, eles aparecem no patrimônio do magistrado. A filha de Sideni, Renata Pimentel também aparece em trnasações de família. “Aparentemente há confusão patrimonial entre os indivíduos da família PIMENTEL, não sendo identificadas transações bancárias que pudessem justificar o trânsito patrimonial”, diz a investigação.
Então, a PF aponta indícios de que veículos e imóveis possma ter sido adquiridos com dinheiro sujo.
Outra esposa citada pela PF é Mirella Thomaz da Silva Cunha, casada com o advogado Felix Jayme Nunes da Cunha ela teria entrado como sócia de uma empresa de transportes, mas, dois anos depois, ela retira-se da sociedade e transfere suas cotas ao marido.
No entanto, as transações revelam que ela transferiu R$ 1 milhão para a conta do sócio na empresa de transportes, Flávio de Morais. No entanto, ela recebeu várias transferências do escritório de Felix.
Esse sócio da esposa de Felix tem ligação com o filho de Marcus Vinicius, filho do desembargador Vladimir e apontado como um dos operadores de venda de sentenças. Assim, a investigação aponta ligação entre os dois em contrato milionário que envolveu várias decisões do TJMS.
Já em relação ao presidente afastado do TJMS, Sérgio Fernandes Martins foi sócio de Jaime antes de assumir o cargo de desembargador. Ele também entrou na magistratura pelo Quinto Constitucional por indicação da OAB. “Há evidências do possível pagamento de propina, por parte do advogado FELIX JAYME NUNES DA CUNHA”, aponta a investigação.
Em mensagens trocadas por Felix Jayme e o sobrinho do conselheiro Osmar Jeronymo, Danillo Moya Jerônymo – servidor do TJMS que também foi afastado do cargo -, o advogado antecipa o resultado de um julgamento que teve participação de três desembargadores investigados (Sérgio, Marcos e Divoncir) e dispara: “ontem eu terminei de pagar os caras lá”.
PF pediu prisão de desembargadores, empresários e advogados
A PF (Polícia Federal) pediu a prisão de 12 dos 26 investigados por suposto esquema de venda de sentenças no TJMS.
Entre os que tiveram pedido de prisão representados pela autoridade policial estão os cinco desembargadores que foram afastados do cargo: Vladimir Abreu da Silva, Alexandre Aguiar Bastos, Sideni Soncini Pimentel, Sérgio Fernandes Martins e Marcos José de Brito Rodrigues.
Além deles, também foi representada prisão do conselheiro afastado do TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado), Osmar Domingues Jerônymo, e seu sobrinho Danillo Moya Jerônymo – que é servidor do TJMS.
Também foram alvo de pedidos de prisão: Júlio Roberto Siqueira Cardoso – desembargador recém-aposentado flagrado com R$ 2,7 milhões que foram apreendidos -, Diego Moya Jerônymo (parente de Osmar Jerônymo e proprietário da empresa DMJ Logística e Transportes Ltda), Everton Barcellos de Souza (sócio da DMJ), Percival Henrique de Sousa Fernandes (proprietário da PH Agropastoril) e o advogado Felix Jayme Nunes da Cunha.