Hoje em dia parece impensável, mas na década de 1960 a Argentina lamentava, ainda que em tom de brincadeira, não poder convocar para a sua seleção um atacante brasileiro e negro que brilhava com a camisa do Racing.
“Pena que ele não é nosso!”, dizia o título de uma reportagem do Sport, suplemento mensal da revista argentina El Gráfico, de agosto de 1969.
O “ele” em questão era Walter Machado da Silva, centroavante revelado pelo São Paulo e com passagem pelo Flamengo que, naquele ano, chegara ao clube de Avellaneda. As duas equipes se enfrentam nesta quarta-feira (29) pela semifinal da Copa Libertadores.
Campeão carioca pelo Rubro-Negro em 1965, o Batuta, como era conhecido o atacante, chegava ao futebol argentino com o cartel de grande reforço. Além das boas atuações por Flamengo e Corinthians, foi companheiro de Pelé no Santos e integrou o elenco da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1966.
“Silva seria bem recebido [na Argentina] e logo se sentiria adaptado. Nas primeiras semanas, viveu num hotel em Buenos Aires. Depois é que a família veio. Morariam na Rua Añasco, esquina com a Avenida Rivadavia, no bairro de Caballito. Alugara um bom apartamento de quatro quartos para toda a família e para os parentes que sempre o visitavam”, escreve Marcelo Schwob no livro “Silva, o batuta”, uma biografia do atleta.
O atacante logo mostraria as suas credenciais. No Metropolitano de 1969, disputado no primeiro semeste, marcou 14 gols e terminou a competição como artilheiro, o que faz dele o único brasileiro até hoje a terminar um Campeonato Argentino como goleador.
Em meio à campanha no Metropolitano, o Racing veio ao Rio de Janeiro para um amistoso contra o Flamengo, no Maracanã. Segundo o biógrafo Marcelo Schwob, a intenção do clube argentino com a viagem era arrecadar dinheiro para fazer o pagamento de parte dos direitos econômicos de Silva.
A Academia venceu por 3 a 2, e o Batuta anotou um dos gols.
No segundo semestre de 1969, Silva continuaria sua fase artilheira. Contudo, apesar de ter caído nas graças dos torcedores e do bom desempenho em campo, sua família não se adaptou à vida em Buenos Aires e o jogador decidiu retornar ao Brasil, encerrando sua passagem pela equipe argentina com 28 gols em 39 partidas — média de 0,72 gol por jogo.

“Técnica, personalidade e olfato. Tudo junto em uma mesma pessoa. Tudo junto em um mesmo futebolista. Quem o viu jogar confirma: era um verdadeiro fenômeno com a bola nos pés”, diz o site do Racing, que mantém um verbete dedicado ao brasileiro na seção de ídolos.
Após se despedir da Argentina, Walter Machado da Silva defendeu o Vasco, pelo qual foi campeão carioca em 1970. Batuta ainda teria passagens por Botafogo, do Rio; Rio Negro, de Manaus; Junior Barranquilla, da Colômbia; e Tiquire Flores, da Venezuela, onde pendurou as chuteiras.
Trabalhou como auxiliar técnico e treinador nas categorias de base do Flamengo e, a partir da década de 1990, virou funcionário do setor social do clube, na área de eventos.
Em 2020, depois de uma semana internado com Covid-19, morreu no Hospital Pró-Cardíaco do Rio de Janeiro, aos 80 anos.











