Estive com o presidente do Comitê Paralímpico Internacional (IPC), o brasileiro Andrew Parsons, poucos dias após a Cerimônia de Abertura dos Jogos Paralímpicos de Paris, em um evento promovido pela Embaixada do Brasil na França. À ocasião, ele comentou sobre a grande expectativa pelo que estava por vir na capital francesa, fruto de uma integração legítima (e até certo ponto inédita) entre os universos olímpico e paralímpico, promovida pelo Comitê Organizador de Paris 2024. Com raízes profissionais fincadas na comunicação, Parsons falou de engajamento e, para isso, da importância de nomes globais para o segmento.
Pois se o Movimento Paralímpico buscava um ídolo global depois do sul-africano Oscar Pistorius (“o cara” em Londres 2012), os recém-encerrados Jogos de Paris podem ter apresentado ao mundo um candidato e tanto ao posto: o brasileiro Gabriel Araújo, o Gabrielzinho, que encantou a torcida com seu talento e carisma sendo o rosto (ou o sorriso!) da campanha histórica do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB).
Na edição paralímpica com maior número de ingressos vendidos (2,5 milhões, 100% da carga à disposição), maior número de emissoras detentoras de direitos de transmissão (165 territórios cobertos mundo afora, sem contar a parceria do IPC com o YouTube) e maior número de imprensa credenciada, o nadador mineiro, dono de três medalhas de ouro na Arena La Défense, tem o terreno preparado para ser um ícone sem fronteiras, em que pese (e isso sempre pesa) falarmos português e não inglês.
No Instagram, o atleta de 22 anos ganhou mais de 400 mil seguidores depois dos Jogos de Paris. Apelidado de “Golfinho” e reverenciado por torcedores e imprensa franceses, Gabrielzinho foi destaque na Cerimônia de Encerramento no Stade de France ao ser citado como um dos nomes dos Jogos no discurso do presidente de Paris 2024, Tony Estanguet, e ser tietado por atletas de diversos países. Dançando e sorrindo do alto de seu 1,21m, Gabrielzinho fez mais do que chamar para si o status de grande campeão da geração TikTok: sambou na cara da sociedade uma deficiência física severa, a focomelia, doença congênita que impede a formação normal de braços e pernas. Sim, o fim do capacitismo passa por isso, e muito.
Em dezembro, Gabrielzinho será um dos destaques do documentário “Da Inclusão ao Pódio”, que será exibido em quatro episódios no Globoplay, em uma parceria entre o CPB e a Bushatsky Filmes. O CPB, aliás, há muito já parece ter entendido que existe o marketing de causa e tem buscado receitas em fontes ligadas também à responsabilidade social. Tem feito de seus parceiros comerciais (como Havaianas, Asics e Toyota) embaixadores da inclusão da pessoa com deficiência por meio de iniciativas como chinelos pensados para anatomias diversas e a venda de apenas um pé de tênis para amputados, por exemplo. E agora, claro, faz planos para campanhas estampando o rosto do momento.
Fazer do mundo um lugar mais inclusivo por meio do esporte é a missão comum de IPC e CPB, que, com isso, podem ter achado em Gabrielzinho o garoto-propaganda perfeito.
Manoela Penna é consultora de comunicação e marketing, e escreve mensalmente na Máquina do Esporte