Embora tenhamos observado melhorias nos últimos anos, o cenário feminino de e-Sports ainda enfrenta desafios significativos e uma desigualdade marcante. As mulheres continuam a enfrentar barreiras que vão desde o acesso às oportunidades até o combate ao preconceito e aos estereótipos estabelecidos. O investimento em torneios, programas de apoio, educação e capacitação é crucial para superar essas barreiras e criar um ambiente inclusivo onde todas as vozes sejam ouvidas e valorizadas igualmente.
Ninguém melhor para falar sobre incentivo e investimento no cenário feminino de e-Sports do que Babi Micheletto, uma das maiores referências do setor e por quem tenho grande admiração. Babi é a idealizadora e produtora do Torneio Taça das Minas e do Taça das Minas Awards. O Taça das Minas é um torneio pertencente ao circuito Game Changers Academy, apoiado pela Riot Games, que visa incentivar e apoiar todas as equipes do cenário inclusivo de Valorant, sejam amadoras ou profissionais, por meio de competições.
A conexão de Babi com os esportes eletrônicos começou como jogadora profissional de CS 1.6, mas foi o desejo de eternizar jogadas memoráveis que a levou a se tornar uma caster em 2018. Ela foi pioneira na narração de games no Brasil, sendo reconhecida como a melhor caster de 2022 pelo Prêmio e-Sports Brasil. Hoje, ela é narradora oficial de Valorant pela Riot Games e expandiu sua presença para os esportes tradicionais, narrando partidas de futebol pelo Canal Goat.
Nesse bate-papo, falamos sobre o cenário feminino dos e-Sports, seus desafios e expectativas para o futuro.
Roberta Coelho: Como surgiu a ideia da Taça das Minas? Quantos anos tem, quantas edições já foram realizadas e quantos times costumam se inscrever?
Babi Micheletto: A Taça das Minas surgiu da vontade de fortalecer o cenário ao qual pertenço, criar oportunidades e espaços para que as pessoas incluídas nesse cenário se sintam seguras em participar, não tenham medo de julgamentos e não sofram qualquer tipo de preconceito ou machismo. O torneio teve sua primeira edição no final de 2022 e já soma oito edições, com um calendário com ainda mais cinco edições em 2024, totalizando seis no ano somando a de maio que ocorreu agora. Geralmente, cerca de 20 times se inscrevem, na última edição em maio agora (dias 8 ao 12), tivemos o total de 34 equipes participantes.
RC: Sabemos que muitos e muitas pro players foram descobertos em campeonatos amadores. Na sua opinião, qual é a importância desse cenário amador para o desenvolvimento do cenário profissional de eSports? Como você vê os campeonatos amadores contribuindo para que as mulheres se destaquem ainda mais nos e-Sports, e quais são as oportunidades que esses eventos oferecem para impulsionar a evolução e o sucesso das mulheres no mundo dos games?
BM: O cenário amador serve exatamente para que novos talentos sejam revelados, iniciem uma carreira… sejam vistos! Costumo dizer que o Taça das Minas é uma vitrine para o competitivo, já que diversos donos de organizações aguardam e acompanham o evento ansiosamente para saber em quem ou qual time vale vestir a sua camisa. No Taça das Minas, a gente busca sempre trabalhar muito com a imagem dos players, sempre mostrar os rostinhos deles, fazer o pessoal ir gravando quem é… damos esse espaço porque achamos importante essa visibilidade para a carreira deles dentro do VALORANT.
RC: Olhando para o crescente interesse e apoio aos esportes femininos, especialmente considerando a alta demanda por cobertura e apoio dos fãs e a tendência dos espectadores em recompensar marcas que investem nesses esportes, você acredita que os e-Sports podem se beneficiar desse movimento para aumentar a receita de patrocínio para o feminino e continuar crescendo como esporte? E os campeonatos amadores também podem se beneficiar?
BM: Sinceramente, quando se fala de evento feminino/inclusivo, ainda tem-se muito medo de investimento nessa área. O próprio Taça das Minas é carente desse apoio, mesmo sendo o principal campeonato de entrada para o competitivo de Valorant e ainda tendo a única premiação voltada somente ao cenário inclusivo, o Taça das Minas Awards. Sinto muita resistência e medo de marcas investirem realmente no cenário. O que é uma pena, pois sabemos que a porcentagem de mulheres que consomem games é altíssima. Mas, como uma boa brasileira, ainda tenho esperança para que esse jogo vire, e grandes investimentos abracem esse cenário tão carente, seja como organização, como campeonato, o que for… Só queremos e merecemos ter o reconhecimento e valorização nos games também. Independentemente do investimento de terceiros, nós do Taça das Minas vamos continuar fortalecendo o cenário até onde conseguirmos.
RC: Para finalizar, gostaria de saber a sua opinião sobre como podemos incentivar ainda mais a participação feminina no cenário amador dos e-Sports e como você vê as perspectivas para o futuro?
BM: Acredito que fazendo exatamente o que estão fazendo, dando espaço para que a gente fale! Mostrando nossos projetos, nossas atletas revelações, incentivando novos times, promovendo material de mídias para maior alcance público do cenário. Sobre o futuro, ainda que com passos de formiguinha, vamos evoluindo… sem pressa, mas com muita garra e vontade, afinal é a gente pela gente. Você desistiria de você? Não, e é isso que move o cenário inclusivo… se desistirmos dele, estaremos desistindo de nós mesmas. Mesmo com tantas incógnitas sobre investimentos no cenário, digo que estamos alcançando bons números e visualizações, os times têm cada vez mais fãs fiéis e isso torna tudo mais competitivo e saboroso de viver.
Roberta Coelho é CEO da equipe de e-Sports MIBR e escreve mensalmente na Máquina do Esporte